quinta-feira, 26 de abril de 2012

Aventuras

Domingo de trabalho. Fico suspirando, mas pelo menos estou em casa, perto dos pequenos. Eles acabaram de tomar banho e o pai, louco para vê-los anjinhos, dormindo, propõe: 
- Agora vamos ficar quietinhos, assistindo um desenho.
Os dois se sentam, comportadíssimos. Mas é só o Maia sair que o Pedro, serelepe, dá um pulo da poltrona e:
- Nani, você quer mesmo ver desenho ou... VIVER UMA AVENTURA??!!
- Desenho. - monossilábica.
- Ah, Nani, tem certeza?! Eu acho que você quer viver uma AVENTURA!!! - cheio de lábia.
- Tá bom, Pepê. Aventura!
A Nani pula da poltrona e se vira pra mim, que devo estar com aquela cara de mãe coruja, babando as crias. Ela derrama um sorriso dengoso e pergunta:
- Vamo também, mamãe?
- Aaaiii, Nani, eu não posso...
- Por que, mamãe? Ahhh, você é pequena...

domingo, 22 de abril de 2012

Piladinha (?) - versão do Pedroca


Essa quem me contou foi o Pedroca:
- Mamãe, e ontem, a Nani tinha acabado de tomar banho. Aí, né, ela tava com aquela faquinha [de plástico], sabe? 
- Hã, hã... E aí?
- Aí ela veio pra mim correndo e gritando: - Tô piladinha! Tô piladinha!
- Hahaha, essa Nani! Ela adora ficar peladinha, né?
- Ah, mas ela nem tava pelada, mamãe. Ela já tinha colocado a roupa!!!
- Ué? Num intindi...
- Eu também não tinha entendido: ela tava era gritando "Tô pilatinha!". Por que tava achando que era pirata!!! É doida essa Nani.


sábado, 21 de abril de 2012

Melusina

Encontrei a expressão literária do meu amor pela água.


"Vindo ao lago, a Melusina 'rompia com todas as formas destino social. Enchia a taça do nada da natureza. Fazia-se imensa no suicídio. Mas quando, banhada até o fundo do coração, ela reencontrava o mundo e a sua sequidão, sentia como se fosse a água do lago. A água do lago se levanta. Ela caminha.'"

(Jacques Audiberti, Carnage. Em Bachelard, Poética do devaneio.)

quinta-feira, 5 de abril de 2012

   Fim da jornada como apertadora de vírgulas na Fábrica de Livros Didáticos. Saio à rua e, em meio ao trânsito da grande Sampa, abro com ânsia pulmões e olhos para o horizonte um pouco mais amplo. E que sorte linda: a LUA. Cheia, plena, dançando no céu. Senhora do mundo. Flor da Noite. Selene. Adoyá. Luz do canto de Sherazade. Senhora da palavra da vida, encantando a morte.
  E me ponho a devanear (mergulhada em Bachelard, em sua Poética do devaneio) sobre uma cena futura de um breve devir, espero. Pedroca, Nani, eu, Maia diante do mar, cabeça no colo da areia. Marcando o passar dos dias e das noites não apenas pela foice de Chronos (uma das muitas imagens do querido mestre Marcos Ferreira Santos que não me saem da imaginação), mas pelas marés, pelo mudar da lua, seu doce nascer-desabrindo-se à morte, pelo milagre dos peixes, pela migração dos pássaros.
   Que doce caminhada até a costumeira estação de trem me proporcionou esse futuro imaginado. Tenho lido muito vocês, Bachelard, Manoel de Barros, Hilda Hilst... Somos imbuídos de poesia e de sonhos. Só é possível viver num mundo imaginado, creio eu. Calderón de La Barca, tens razão: "Toda a vida é sonho / e os sonhos, sonhos são".
   Ah, linda Sophia de Mello, teu poema é para mim um canto doloroso, um canto de liberdade.

   Cidade, rumor e vaivém sem paz das ruas,
   Ó vida suja, hostil, inutilmente gasta,
   Saber que existe o mar e as praias nuas,
   Montanhas sem nome e planícies mais vastas
   Que o mais vasto desejo,
   E eu estou em ti fechada e apenas vejo
   Os muros e as paredes, e não vejo
   Nem o crescer do mar, nem o mudar das luas.

   Saber que tomas em ti a minha vida
   E que arrastas pela sombra das paredes
   A minha alma que fora prometida
   Às ondas brancas e às florestas verdes.